just poetry

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a ciência do cipó

poema de 2004

Meu avô de pé, sólido, da janela

olha os amplos pastos verdes

e as brandas manchas brancas sobre eles.

O gado nelore à distância caminha e rumina capim.

Meu avô, na sala da casa da infância,

em outro tempo, ecoa agora em mim.

Estou em pé, palmas das mãos sobre os rins.

Repito seu gesto, meus olhos sobre outro pasto.

Lagoa, cidade, montanhas, céu estrelado.

Na fazenda, mais estrelas se mostravam.

Mas não as incontáveis luzinhas da cidade,

dos inúmeros edifícios, dos presépios das favelas.

Vestígios de vida na noite urbana.

A cidade do Rio de Janeiro, fazenda que guardo

tal qual meu avô fazia com suas terras.

pelo desvão da rocha

atravessa

o seio dos dois irmãos

o pedaço alvo de nuvem

Diz o velho ditado:

“quem sai aos seus não degenera”

mas o que restaria dizer

aos filhos do degenerado?